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26 de set. de 2021

Certidão de nascimento do Poetrix

 

Registro histórico do lançamento do livro Poemetos Tropi-kais, de Goulart Gomes, em 26/09/1999 que marcou a data de nascimento do  POETRIX! 


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17 de jul. de 2021

Análise Crítica, Pedro Cardoso

Antologia Analítica

Por Pedro Cardoso


Prezados amigos poetrixtas e amantes dos tercetos que chamamos de Poetrix.

Faz alguns anos que venho colecionando os Poetrix dos meus sonhos, poemas que gostaria de ter escrito. E, de alguma forma, os considero como sendo de minha autoria, ainda que... por alguns segundos.
Sempre os leio com admiração e zelo. E, quanto mais o faço, mais escrevo sobre eles. Às vezes peço à minha mulher para lê-los em voz alta, para que eu possa senti-los melhor. Deste modo, vou retirando deles as minhas conclusões. É assim também que vou registrando os meus mais puros devaneios poéticos.

Estou constantemente buscando novas possibilidades de leitura e interpretação daquilo que o autor deixou registrado.
Sempre me baseio nas entrelinhas e nos ensinamentos de Ítalo Calvino, que é, praticamente, o nosso norte, o nosso guia enquanto escritores de Poetrix.
É importante deixar claro que essas são as minhas interpretações, mas que outras, com certeza, serão feitas e quem sabe até, de formas contrárias às minhas.

Em tempo... este é um eficiente processo de aprendizagem. O que mais gosto. E que agora compartilho com vocês, por acreditar que contribui imensamente no treino e uso da Bula Poetrix, em todos os seus ensinamentos.

1 - Aparências

óculos sem lente
atente
só armação

Vejam só! Vou fazer uma... leitura deste Poetrix, que é de autoria do poetrixta Dreyf, um amigo de São Paulo.

O título "Aparências" se encaixa perfeitamente ao texto. Deixa claro que se trata de algo que se usa como "disfarce", ou que transforma a imagem das pessoas. Aquilo que se mostra imediatamente.
O primeiro verso: "óculos sem lente", é algo inusitado - um SUSTO!
No poema, este verso tem uma força bem marcante. É sem dúvida o verso mais robusto do terceto.
Ele rima com o segundo verso, uma rima super interessante - lente com atente.
Às vezes, os óculos são tão fortes que se tornam uma marca registrada em algumas pessoas. Como exemplos, ressalto as figuras de John Lennon e Janis Joplin. Seus óculos faziam parte de suas personalidades. Talvez nem precisassem das lentes!
Mas o grande lance está no terceiro verso, onde a palavra "armação" impõe um duplo sentido ao texto: o leitor pode ler uma "armação propriamente dita", como pode ter a sensação de uma "armação" preparada pelo vendedor que tenta frauda-lo na hora da venda.
Este artifício é muito bom. É rara uma artimanha desta natureza.

2 - desculpe

o transtorno:
estou em
construção

Um exemplo de Poetrix do poeta Beto Quelhas.

Este terceto nos mostra uma característica distinta. Esta não é uma configuração comum. Aqui, como podemos ver, o título faz parte do texto. Sem ele o poema ficaria sem visibilidade, sem sentido algum. Ainda mais por sua concisão, com poucos vocábulos. Mas quando lido na sua totalidade, faz todo o sentido.
É como se fosse uma placa de advertência.
É importante observar que ele pode ser confundido com uma quadra. Portanto, cuidado!
Chamo atenção também para a sua estética, bem refinada.
É singular atentar que o autor não usa letras maiúsculas no seu texto, isto é uma carteirista própria dele, uma marca registrada do poeta Beto Quelhas. Gosto desta particularidade, embora não a utilize.

3 - Sonsas

Estrelas
não dizem a verdade.
Elas piscam

Um terceto da poeta Lílian Maial, que sempre vai e volta em minhas leituras.

O que falar deste poema?! Já o li inúmeras vezes e, quanto mais o leio, mais me encanto por sua simplicidade e delicadeza. Ele foi escrito há um bom tempo e não saiu do meu foco. Estou sempre a reverenciá-lo.
O título "Sonsas" é muito bem pensado. Induz o leitor a um possível enigma, alguma traquinagem, algo que age de modo sorrateiro, que esconde suas reais verdades. Observe que quando se diz que determinada pessoa é sonsa significa que ela aparenta ser de alguma maneira agradável, inocente ou ser digna de outros adjetivos, mas no fundo, não é!
Começa com "Estrelas", com letra maiúscula. Podem ser as Estrelas do Universo ou pessoas- Estrelas. Isto será reforçado no desfecho do Poetrix: 'Elas piscam", abrindo novamente a possibilidade do duplo sentido.
No segundo verso temos um ponto final. Este sinal gráfico, como o próprio nome indica, é utilizado no final de frases para que se faça uma pausa mais longa, o que provoca no leitor um susto - "não dizem a verdade." A pontuação, neste caso, é vital.
O texto em si realça o que foi dito no título.
Este é um achado que só se vê nos Poetrix muito bem elaborados, bem pensados.
Este é o poder da concisão.

4 - Este é um dos experimentos do meu amigo/irmão, Hércio.

- fosse eu foice
drástico o corte
- vida e morte

Fiquei surpreso ao ver que realmente não havia um título explícito. (Há que se lembrar que no início do movimento Poetrix, o título era recomendado e não obrigatório). Logo em seguida, ele justificou que o seu poema havia nascido pagão.
As regras atuais do Poetrix rezam que os títulos são indispensáveis, obrigatórios. São eles que direcionam o leitor, que dão a ideia do que vai ser tratado.
É lícito dizer que a grande maioria das pessoas só conhecem os títulos das obras. Seus conteúdos, seus enredos, suas falas, muitas vezes são verdadeiros mistérios escondidos nos livros das prateleiras das bibliotecas. Assim sendo, o Hércio, na minha visão, pode dar nome ao seu poema a qualquer dia e hora, sem prejuízo algum, fazendo com que ele deixe de ser um filho pagão por excelência.
Ainda digo mais, se eu fosse ele, colocaria o título depois do texto, invertendo a lógica das coisas. (Vale ressaltar que isto não é previsto na Bula Poetrix). Deste modo, o título passaria a ser o enigma da obra. Uma vez que lemos a obra para depois conhecer o seu título. E, como sugestão, ofereço o título: "Severina".

5 - Um Poetrix Concreto de minha autoria.

Círculo vicioso


   S
S O S
   S


Não gosto de, eu mesmo, esmiuçar os meus poemas, acho que o possível encanto desaparece. Mas não vou me furtar a revelar os meus sentimentos, aqui retratados, por exemplo.
Este Poetrix concreto tem uma concisão inacreditável pois só foram usadas uma vogal e uma consoante na sua construção. Chega ao extremo de não termos como contar as sílabas, contudo permite uma infinidade de interpretações.
É circular, é dinâmico, é apelativo, é instantâneo e de grande força visual.
Retrata um pedido de socorro, em qualquer idioma.
Além de ter uma estética diferenciada e chamativa.
É assim que o vejo e revejo, constantemente. Na expectativa de que um dia ele salte dos meus olhos.

6 - Gostaria que observassem o Poetrix da poeta Áqueda Mendes da Silva.

No céu cor de chumbo

ora em fita
ora em flecha...
fogem as garças

Veja o título: “No céu cor de chumbo”. A autora já nos leva a imaginar um sinal de perigo, nos dá um aviso de que algo é ameaçador, que o tempo não está nada tranquilo. Ela se posiciona: a situação é de total pavor.
Aqui ela nos mostra, claramente, o medo perante a um fenômeno da natureza, que se avizinha.
Quando ela diz: "ora em fita/ora em flecha...", está descrevendo ao leitor a dinâmica da situação, que vai se alternando há todo instante. Sabe-se que essas aves vão se revezando na dianteira em seus voos para que possam atingir longas distâncias sem que um dos seus membros seja sacrificado ou que tenha que fazer um esforço além de suas possibilidades.
No terceiro verso, o susto: "fogem as garças". É praticamente possível “ouvir” a algazarra que elas fazem quando estão em risco de vida.
Nessa situação, voam com maior rapidez. Aos gritos, revelam o temor diante de um acontecimento perigoso da natureza.
Pode-se inferir, inclusive, que tal visão também reflita sentimentos de alguém que assista ou, até mesmo, viva uma situação de ameaça.

7 - Encanta(dor)

uma flauta doce
toda furada
deu nova vida ao bambu

Este Poetrix é de autoria do poeta Hércio Afonso. Está publicado em seu livro: Minha primeira vez, página 60.
É importante observar que o título é fundamental, nos dá a ideia do que pode ser a identidade do poema. É como se fosse a certidão de nascimento da composição.
Veja que, aqui, o título foi dividido para nos dizer que a dor também pode ser transformadora, e transformada...em momentos encantadores!
É interessante observar que existe uma lógica (flauta-furada-bambu) entre os versos e o título.
Os encantadores de cobras que o digam. Com suas flautas, fazem o que querem com as serpentes mais nocivas ao ser humano.
No primeiro verso – "uma flauta doce" – o autor poderia ter dito apenas “uma flauta” que não mudaria em nada o texto, porém ele quis que o leitor percebesse que era um instrumento de bambu e não o de madeira torneada, como era usado na Idade Média que continha aberturas para sete dedos e uma especial para o dedo polegar, que servia como furo de oitava. O "doce" também reforça a ideia de suavidade e positividade.
No segundo verso a expressão “toda furada”, nos leva a imaginar um velho utensílio, judiado...
O terceiro verso nos dá um susto quando reafirma a sobrevida que é dada ao bambu, através do som melodioso do instrumento.
A formação das imagens que vão sendo construídas quando vai-se lendo o poema vão muito além dos três versos e da escrita.
O texto passa a ser uma referência poética.
As imagens permanecem por um longo tempo em nosso imaginário poético e suas sensações também!
É assim que se constrói um belo Poetrix. Não basta escrever três versos. É preciso que se use rimas ricas, que se ofereça ao leitor imagens elegantes que o façam viajar para outros acordes, novos mundos metafóricos.
Que dê a quem lê, uma nova dimensão das coisas.
É por isso que eu repito: E viva a poesia!!!

8 - destino

na dúvida
siga as borboletas
:elas sabem

Sempre que leio os Poetrix do amigo Beto Quelhas percebo, na maioria deles, a intenção de uma apresentação que seja esteticamente semelhante à do Hai-cai. Esta é uma outra marca registrada do autor.
Outro detalhe que me chama a atenção em seus Poetrix, salvo engano, é o fato de que ele sempre coloca a primeira letra do título em destaque.
Veja, no Poetrix acima, que a letra “d” não está escrita com letra maiúscula. Aqui não dá para perceber, mas no original a fonte é diferente e está na cor vermelha, um destaque visual bem interessante. Esta é uma característica marcante e forte nos escritos do autor.
Quanto à qualidade do Poetrix e da mensagem... por ele passada, não é necessário dizer muita coisa. Poderia falar de metamorfose, cores, leveza, destino... enfim, várias simbologias. Mas ele fala por si !
Um Poetrix de tirar o fôlego! Carregado de significado.

9 - Dizer-me

não vale
a pena
... nem a tinta

Este poema é da poetisa Sônia Godoy, uma autora de extrema concisão e realismo em suas palavras. Não foi à toa que a escolhi como Patrona da minha Cadeira, de número 18, na AIP (Academia Internacional Poetrix).
O título faz parte do texto, sem ele, o poema fica solto. Ele é fundamental para o entendimento do leitor, ainda mais para aquele que não está acostumado com a perspicácia do minimalismo.
O poema nos passa a sensação de um desabafo, com luvas de pelica. O desdém é absurdo!
A palavra "pena" tem dois sentidos importantes no contexto. Numa primeira leitura podemos dizer que não vale a "pena da caneta". É algo sem valor monetário. Em uma releitura, no entanto, podemos entender que não vale a pena perder tempo, nada mais faz sentido, não vai-se tentar novamente uma auto tradução.
O terceiro verso: "... nem a tinta" é de uma ironia que chega a doer na carne, o desprezo é total. As reticências aparecem como um derradeiro suspiro, mesmo estando no início do verso, uma última pausa para o veredicto final. Mostra que tudo já foi dito.
A autora revela que só as palavras não bastam, que é necessário muito mais do que isso. E que, talvez, só o toque, o roçar, o falar com as mãos fossem capazes de traduzi-la.

10 - Outro poema que escolhi para continuar com meus comentários foi da Ângela Bretas.

(Má)(Temática)

não adiciono
sou
sub(traída)

Este poema não necessita do título para ser compreendido, o texto por si só, já nos oferece a mensagem que a autora quis passar. Isso não implica dizer que o título não seja relevante, pelo contrário.
"(Má)(Temática)" é algo fabuloso, nos oferece duas leituras completamente distintas, que estão intimamente relacionadas com o todo.
A (Má) temática, nos leva ao entendimento de que o assunto é ruim, de que talvez o tema "amor", por exemplo, seja cabuloso, complexo.
Por outro lado, temos a Matemática como ciência exata.
Isto se repete quando lemos "subtraída", no sentido de que ela foi diminuída (se assim podemos falar) da relação, ou seja, foi alijada da vida do outro. Assim como no primeiro verso, onde ela afirma que não adiciona, não acrescenta.
A sutileza da ironia está no sub(traída). Aqui a autora afirma que foi traída, mas quando coloca a palavra traída entre parênteses, antecedida de "sub", ela talvez possa estar sugerindo que foi traída por alguém inferior a ela, alguém que já não faz a menor diferença. Ou talvez que ela seja, ou se sinta, diminuída.
A "ironia" já se apresenta desde o primeiro verso, quando escreve: "não adiciono".
Um Poetrix forte, ousado e carregado de sentimentos!

11 - Morte
Anthero Monteiro

uma cadeira vazia na alameda
sentada numa tarde de outono
a olhar o meu ponto de fuga

Antero Monteiro é um poeta português que sempre nos presenteou com sua escrita de forma clara e gostosa.
Em 2003, postou na página do grupo Poetrix o poema Morte.
Já no título fala na existência da alma nos poemas.
Para algumas religiões a alma está relacionada com a transcendência do corpo.
No Poetrix isto acontece, porém, de formas diferentes. A alma está também relacionada à dimensão, ao alcance dele. Uma outra forma de transcender.
Veja que no primeiro verso está dito: "uma cadeira vazia na alameda" e, no segundo: "sentada numa tarde de outono". Quem está sentado? A cadeira está vazia. Alguém não está mais ali, presente.
O terceiro verso é límpido: "a olhar o meu ponto de fuga". Quem está fugindo? O ponto de fuga dá a profundidade dos objetos, é a linha que traça o nível do olhar em relação ao horizonte - lá longe, a fugir dos olhos.
É assim que o autor talvez estivesse se olhando. Ali, construindo a sua perspectiva, sua visão tridimensional em relação à Morte, ou até à sua morte. Veja que ele projetou seu ponto de fuga em uma alameda, em uma tarde de outono, justamente quando as árvores estão mudando suas folhas.
Ele (ou outro alguém) estava construindo o seu caminho encantado...quando as árvores tornam-se amareladas ou avermelhadas..
A concepção do poema em relação ao mistério da morte e a dor do autor, são a liberdade, a sublimação.

12 - Um dos exemplos que mais gosto dos poemas Concretos, dentro do Poetrix, é "Devolva-me", da poetisa Sônia Godoy, uma das mais importantes escritoras desta nova linguagem, minha Patrona!
Fiz "uso" dele, inclusive, para iniciar meu discurso de posse, na AIP (Academia Internacional Poetrix)

Devolva-me

       AS
          AS
             AS

Este poema está absolutamente dentro dos padrões aceitos como Poetrix, ou seja: é um terceto (onde os três versos estão representados pelas letras A e S), tem título, tem concisão e acima de tudo, tem personalidade.
A leitura poética parece simples, mas não é.
Uma das possíveis leituras nos leva a entender que a autora está pedindo que lhe devolvam a liberdade, as asas - o poder sair por aí, pois algo estaria lhe sufocando, lhe tirando o oxigênio.
É importante notar que, mesmo sendo um poema Concreto, o título, neste caso, exerce papel fundamental na compreensão do texto. Sem ele o entendimento seria impraticável.
Outro ponto marcante é que a autora não escreveu o texto na vertical, o que seria mais lógico. Preferiu uma escrita na diagonal para nos passar a ideia de que as suas inquietações estão em constante agitação, uma vez que "as asas" sugerem tais movimentos.

Vejam uma outra leitura, feita pela poeta Tê Soares, uma ferrenha defensora do Poetrix, professora de Literatura e uma baita Amiga.
"Este Concreto exige um certo voo na leitura já que eu o interpreto como tendo a mensagem final: devolvam-me as asas, os sonhos, a capacidade de sair do chão. A forma que o aprisiona é a mensagem subliminar do Concreto. Nem sempre retratar uma contradição é fácil e, nesse caso, o visual se apresenta como uma imposição da realidade, já que, de outra forma (as sílabas em outra posição), representaria leveza".

Mais uma leitura possível, desta vez, de uma contista gaúcha de nome Tânia Melo, uma amiga que gosta dos Concretos.
"Interpretei, inicialmente, como o “querer de volta”, diversas coisas que lhe foram roubadas pela relação. Só depois consegui vislumbrar "as asas" e, com isso valorizei ainda mais o poema, muito bom".

Agora, a leitura da própria autora (escrita para mim, tenho muita honra em dizer!): “Estava apaixonada, fui abrindo mão de tudo, perdendo as asas. Finalmente tentei voar, voar pra longe (mas não conseguia), assim descobri que as asas são formadas por “as” e mais “as”. Daí... Foi só gritar, gritar: Devolva-me as asas, como se a culpa da minha incapacidade fosse ele. A riqueza dos poemas Concretos me inspirou a escrever este poema

Formas diferentes de falar de coisas semelhantes.
E viva a poesia!!!

13 - Outro Concreto que me chama a atenção é o poema “Exemplo”, da poetisa baiana Sandra Mamede, que está sempre nos brindando com seus belos Concretos.
                                  v
                               i
                           v
                       a
                   m
               o
           s
como
           o
              s
                 g
                    a
                       n
                           S
                              O
                                 S

O mais intrigante é a ideia da autora de nos conclamarmos a viver como os gansos... em bando.
Veja que ela nos remete a uma forma de vida mais rude, supostamente, do que a que vivemos hoje. Esses pássaros são, como diz o título, exemplos de cooperativismo, onde um "puxa" o outro. Dizem, os mais entendidos no assunto, que quando o primeiro está cansado, ele troca de posição com o que está mais atrás, visando atingir um bem comum. Esta mudança é para que nenhum deles fique mais sobrecarregado do que o outro.
Outro dado fundamental neste poema está na ponta da asa inferior, onde a autora pede socorro. Escrevi o “SOS” com letras maiúsculas para ratificar o detalhe.

Tê Soares registrou: "Este é magistral. É contundente, explícito e me deixa sem ter o que falar pela concretude, pela capacidade de ser a poesia na imagem fiel da realidade".

Tânia Melo comentou: "O poema dos gansos é belíssimo. Fala só pela imagem, mesmo antes de serem lidas as palavras".

14 - É interessante escrever sobre Poetrix, em especial, de amigos. Às vezes eles nos levam a outros mundos e interpretações, que nem os próprios autores imaginaram.
Este é um dos exercícios que mais gosto de fazer quando leio esses pequenos poemas. Pequenos na escrita, nos dizeres... porém, verdadeiros gigantes nas possibilidades!
Vai aqui a minha leitura sobre dois destes poemas da saudosa poeta Kathleen Lessa.

(AD)VENTO

A (real)idade não existe...
Ao vento (a)vento-a,
(In)vento-a. Ventoinha.

Já, no título, percebemos a preocupação da criatividade que se estende para todo o texto.
É curioso notar, nos escritos da autora, a preocupação da escolha das palavras que oferecem duplo sentido. Fica clara a intenção de não apenas escrever mais um texto, mas sim, brincar com ele de uma maneira mais agradável e exuberante.
O primeiro verso, de forma subliminar, nos diz que a real idade não existe. Nem a realidade...talvez exista.
No segundo e no terceiro, a autora faz um bom jogo de palavras, para dizer que inventa a real idade.
A palavra “ventoinha”, uma peça de carro que serve para resfriar o motor, aqui, funciona como um ventilador que espalha a real idade para o seu mundo e o mundo exterior.
Além de todas essas possíveis leituras, destaco a pontuação do poema. Um elemento importante no contexto do Poetrix. A boa pontuação enriquece o texto, valoriza a leitura.

Outro Poetrix interessante da Kathleen Lessa.

Ah, Maquiavel...

O mundo está vazio
De atitudes honestas,
A que meios justifiquem fins

Um título excelente, bem pensado. Ao invés de usar uma exclamação no final, a autora usou a reticência, como se dissesse: vai, continua...
No primeiro verso ela diz que o mundo está vazio. Eu pergunto: é verdade? Ou ela está "brincando"?!
Maquiavel disse: “O homem prudente deve seguir sempre as vias traçadas pelos grandes personagens...”. Quando a autora afirma que “o mundo está vazio//de atitudes honestas”, ela está nos inquirindo quanto às lições de Maquiavel. E mais, que nós estamos seguindo pessoas erradas; que estamos sendo levados por aqueles que usam de todos os meios desonestos para justificarem seus atos ilícitos.
Quando a autora se refere a Maquiavel, ela nos obriga a uma reflexão política, nos leva a pensar em algo maior do que o próprio poema. Neste caso, o Poetrix serviu apenas como um trampolim, o mensageiro de sua fala!

15 - Uma leitura de um Poetrix da poetrixta Judith de Souza.

Existencial

desertei-me.
nem miragens
me trazem oásis

O título “Existencial” pode, de cara, nos levar ao Existencialismo de Sócrates, Platão e provavelmente, o de Sartre. Para Sartre a existência precede a essência.
Quando a autora diz no primeiro verso “desertei-me” ela dá a entender que está recusando a sua própria existência, provavelmente carente da "água", escassa, que seria essencial para manter-lhe a vida.
Mas ela parece ainda saber da sua importância como pessoa, como ser humano que é.
No segundo e terceiro versos, quando lemos: “nem miragens/ me trazem oásis” podemos inferir que está dizendo que nem aquilo que ela “cria” em sua mente, lhe trás mais felicidade. É possível que o amor que existia fosse maior que a miragem que, agora, apenas na imaginação, poderia lhe trazer o oásis, a redenção.
Não deixa de sugerir a essência da "união" de duas pessoas que se separaram.
Ou até mesmo das dores que a vida tem lhe trazido.
Do lado da técnica este Poetrix é o que todo poetrixta procura. Um título condizente com o texto, um poema conciso, de leitura fácil e que permite várias releituras.
A palavra “desertei-me” é o centro de todo o poema. Uma palavra interessante dentro do contexto, pois trás na sua literalidade a possibilidade de múltiplas interpretações. Uma delas a aridez de estar só ou ainda, a possibilidade de se estar sozinha em meio à multidão. Miragem é outra palavra que induz o leitor a criar em sua mente uma situação real de deserto com oásis por perto. Por falar em oásis, ele se contrapõe ao clima desértico criado no primeiro verso.
Muito bem escrito, sem dúvida!

16 - Um exemplo da poeta Maria Nelci.

Ninguém vê e nada pode ser ouvido

cinema mudo
natureza morta
cegos a olhar!

Um Poetrix interessante! Cheio de dicotomias.
Se fizermos uma leitura atropelada, podemos cair na armadilha preparada pela autora. Ela diz no título: “ninguém vê”. Mas as pessoas não estão dentro de um cinema? E as imagens?
Ela ainda diz: “natureza morta”. Está-se falando de uma obra de arte, um quadro em exposição? As pessoas estariam vendo-o, mas talvez, não estariam o enxergando.
Talvez até seja possível inferir aí uma possível crítica às pessoas que vão aos museus em busca de obras específicas, obras conhecidas mundialmente, e com isso, perdem a oportunidade de verem e descobrirem novas maravilhas.
A concisão do poema é intensa, poucas palavras nos levam a um mundo de várias leituras, este é um dos segredos do Poetrix.
Outro ponto importante do poema está na outra parte do título: “nada pode ser ouvido”. Aqui a crítica é mais severa e verdadeira. Se as pessoas não entenderem, com certeza, de nada adianta o que pode ser dito.
Quanto mais leio este Poetrix, mais imagens e leituras me vêm à mente.
Este jogo entre natureza morta e cinema mudo, é bastante rico. O termo Natureza-morta refere-se à arte de pintar e desenhar objetos inanimados, como frutas, jarros, cestos, entre outros. O filme mudo é aquele que não possui falas e sim sons que correspondem às imagens exibidas. Estas expressões da arte estão ligadas de uma maneira muito peculiar. No cinema mudo você vê, entende o que está acontecendo, embora não ouça os diálogos que são travados através dos sinais. Nos quadros de Natureza-morta você vê e também entende, porém existem significados que vão além do que está ali representado. Essas telas representam cenas religiosas.
As pessoas não veem além...
Por tudo isso e talvez, muito mais, a autora afirma... “Cegos” a olhar!

17 - Este é um dos raros exemplos de Poetrix que tenho guardado a sete chaves. É de autoria do Poetrixta, Lorenzo Ferrari, um amigo que fiz, através do Poetrix. Um dos únicos com o qual foi feito Duplix por Sara Fazib.

Flash

Lança seu andar em calças brancas,
Firmamento de um desejo inalterado
Em sedução e loucura, me calo.

Veja que este Poetrix tem um texto mais extenso, contrastando com o título: "Flash"... não tinha como ser diferente! Em um flash, várias coisas podem acontecer, e, mais ainda, acompanhadas de grandes sensações e sentimentos. Muito bacana!
O título, bem colocado, já nos dá a tônica do texto. Não deixa dúvida de que se trata de algo passageiro e veloz.
Quando o autor diz: "Lança seu andar em calças brancas", logo no primeiro verso, ele está retratando o caminhar "apressado" de alguém que não está ao "seu alcance" - um piscar de olhos e foi-se!
No segundo verso ele revela o seu segredo: "Firmamento de um desejo inalterado".
A cena se passa como um raio, quem viu, viu!
No entanto, nada mudou para ele. Por isso ele diz: "Em sedução e loucura, me calo."
O último verso é muito bonito, nele o autor deixa clara a sua frustração diante do que ele desejava e que lhe fugiu das mãos, em um mísero instante. Aqui eu lhe pergunto, meu amigo, e se este verso fosse assim?

Passar_ela

em sedução
e loucura,
me calo.

Teríamos um Poetrix dentro do outro. Confesso que nunca vi isto. Fica lançada a ideia.
Um exemplo de como um único Poetrix pode ser rico e abrir novas possibilidades poéticas!
E viva a Poesia!!!

18 - Divi_dida

não queria
ser deus,
só duas...

Um Poetrix que gosto muito, da minha amiga, Aila Magalhães.
É até difícil fazer comentários sobre este terceto, tendo em vista sua grande concisão. São três versos bem pequenos, mas carregados de significados.
Um título inovador. Já nos dá a entender que há uma divisão. Ou algo partido ao meio. Ou dois inteiros, separados.
O texto em si não exigiria um título. Diz tudo por si só! Sua importância, no entanto, continua existindo pelo fato de que a Bula Poetrix exige que estes tercetos tenham título. Uma de suas marcas registradas.
O primeiro e o segundo versos formam uma ironia pra lá de refinada, um exagero literário! Ela diz que não queria ser deus. Observe que a autora escreveu "deus" com letra minúscula, deixando claro que ela está se referindo a um deus, quase que de carne e osso. Talvez se reportando a uma deusa, com tantos afazeres, diuturnamente. Um ser "normal", de fato e de direito, não conseguirá fazer tanto! A mulher em seus dilemas e dicotomias.
No terceiro verso, ela se revela como uma pessoa "quase" normal, dizendo que só queria ser duas. Talvez para fazer frente a tantas obrigações cotidianas ou, até mesmo, para ter o direito de ser mais de uma, não se enquadrando em quaisquer estereótipos.
E viva a concisão!!!

19 - Fugaz

cama desarrumada,
liberdade para as borboletas
estampadas nos lençóis...

Como é bom poder falar da minha amiga e parceira, Tê Soares. Companheira dos versos e dos bate-papos lá do início do ano de 2000. Juntos criamos o Duplix, o Triplix e o Multiplix, que têm nos dado tantas alegrias.
Mas o que quero, neste momento, é falar sobre o seu belo e intenso Poetrix.
O título já vem com uma força desproporcional, nos dizendo que se trata de algo que desaparece rapidamente, ou que dura muito pouco. É um momento - efêmero e passageiro.
O primeiro verso já descreve o fato, nos mínimos detalhes - "cama desarrumada". Não precisa dizer mais nada!
O segundo e o terceiro versos são carregados de simbologia. Borboletas que transcendem os lençóis, seus "casulos". É como se a liberdade se tornasse total e irrestrita.

*Este Poetrix tirou o 1º Lugar nos I Jogos Florais, “Palavras e Música”, Chamusca – Portugal.

20 - Assalariado

vende a vida inteira
pelo pão de cada dia
a liberdade boia, fria

Um expressivo Poetrix de Goulart Gomes, o criador do Poetrix. Amigo que ganhei de presente, junto com os tercetos.
Uma crítica social muito forte.
Refere-se aos trabalhadores que têm uma remuneração mensal, a ser paga por serviços prestados.
O primeiro verso expressa nitidamente a revolta do autor com a condição "desumana" em que vivem os que vendem suas vidas por um punhado de moedas.
Continua evidente no segundo verso, quando diz: "pelo pão de cada dia". Aqui ele reforça o que foi dito anteriormente - muito trabalho, pelo básico.
É importante observar que depois da palavra "boia", no último verso, tem uma vírgula. Ela ressalta o significado do que chamamos de "boia-fria", trabalhador que leva sua refeição de casa para se alimentar no lugar em que trabalha. Porém, vai muito além disso. A liberdade do assalariado boia..... fria, ou seja, inexiste.
Penso que o autor está nos dizendo que o assalariado, de modo geral, não consegue fugir do contexto no qual foi inserido e do qual depende a sua sobrevivência e a dos seus. Por tudo isso, sua liberdade é apenas aparente. Porque, "se vende por um prato de comida" - fica à margem da sociedade, como se fosse um número nas estatísticas e não uma pessoa.

A palavra "fria" no último verso, é de uma ironia ferrenha, dantesca. Retrata com exatidão a crueldade que tal situação representa dentro de uma sociedade capitalista. Tão duradoura e injusta, que já esfriou...

Realidade dura, porém, poesia de grande beleza e alcance.

E viva a Poesia!!!

21 - Um exemplo da poeta Sara Fazib.

n a d a d o r

A dor era rasa.
A mágoa
mal chegava no peito.

Este é um Poetrix de rara construção, um daqueles que gostaria de ler todos os dias.
Começando pelo título.
Veja que ela escreveu nadador com espaços entre as letras e com todas as letras em minúsculo, este não é um caso comum. Confesso que ainda não vi outro título escrito desta forma. Isto não foi por mero acaso, não sei o que foi que ela pensou, mas imagino que foi para dar a ideia de que, aquela dor, já vinha se arrastando, deixando um rastro. Que fosse alguma coisa intermitente, que cessa e recomeça por intervalos descontínuos.
Para completar a minha sensação, no título ela ainda rimou nadador com dor. O que ficou muito bom.
Veja que contraponto incrível: o título "n a d a d o r" com o primeiro verso que diz: "A dor era rasa". Ah, que coisa! Na verdade, não era rasa nem funda, apenas uma dor de "mentirinha".
Note que a autora põe um ponto final logo no primeiro verso como se já dissesse tudo. Mas em seguida retoma a fala para dizer que a mágoa nem chegava no peito, para confirmar que a dor, mesmo sendo dor, era algo quase irrelevante.
Uma outra possível interpretação seria a de que a dor ainda não era funda o suficiente para encher o peito e inundar os olhos, mas isto não a fazia pequena. Pelo contrário.
Um Poetrix com uma pontuação bem condizente com o texto, além de uma boa concisão e leveza.

22 - Este é mais um voo poético que realizo com um enorme prazer e dedicação ao Poetrix. Convido vocês a voarem comigo rumo ao infinito dos versos.

E viva a poesia!!!

Pedro Cardoso


4 de mai. de 2021

O MIP ADVERTE:

Orelhas da Antologia 3 - Fogo 
Em comemoração dos 10 anos de criação do Poetrix
Um texto de Lílian Maial e Marilda Confortin

O Movimento Internacional Poetrix adverte:

O uso contínuo dos elementos que compõem o Poetrix pode provocar uma drástica redução da verborragia com alterações significativas na forma de escrever textos técnicos, científicos e literários, causada pela diminuição da prolixidade e pelo dissecamento contínuo das palavras.

Um dos efeitos colaterais mais visíveis do Poetrix é o desenvolvimento do senso de humor e crítico.

Observou-se, entre os praticantes, um apuro na sensibilidade poética, aumento do vocabulário e ampliação da visão.

O exercício constante das formas múltiplas, com a participação de outros poetrixtas, pode provocar mudanças de comportamento tais como: perda da timidez, maior aceitação de críticas e diminuição da fobia social.

Relatos não isolados de cura de prisão de versos, identificação precoce da bipolaridade das palavras e ataques de insight repentinos também foram registrados.

Por ser altamente contagioso e excitante, recomenda-se que o Poetrix seja ministrado juntamente com outros gêneros literários para minimizar a dependência.

Contra-indicações: Parnasianismo exacerbado, mentes cartesianas em excesso, ausência de auto-crítica.

Reações adversas: Poetrixmania, na qual o usuário não consegue parar de fazer Poetrix; delírios poetríxticos, nos quais o usuário tem sempre a sensação de que ainda fará o "poetrix perfeito"; surtos de agressividade (externada ou não), quando o usuário se depara com uma coisa estranha, que o "autor" chamou de poetrix, e não é.

Posologia recomendada: Dose inicial, para os iniciantes, de 3 a 5 poetrix por dia. Manutenção: um único bom Poetrix por semana, com revisão apurada e auto-crítica severa. Nas crises de falta de inspiração, idéias repetitivas, depressão poética, recomenda-se o duplix, com o cuidado de não diluir o Poetrix-raiz em seu efeito curativo.

Interações: O Poetrix interage com o bom-humor, potencializando seus efeitos. Foram observadas, ainda, interação com a sensualidade com efeitos surpreendentes. Podem ocorrer reações coletivas, de intensidades variadas.

14 de abr. de 2021

BULA POETRIX

O hai-kai é uma pérola; o Poetrix é uma pílula. (Goulart Gomes)

Com o objetivo de melhor definir o POETRIX, estabelecendo critérios quanto à sua forma e conteúdo que possam orientar mais precisamente os seus autores – o MIP - Movimento Internacional Poetrix divulga esta BULA POETRIX, conjunto de orientações para o aperfeiçoamento e uniformização deste gênero literário.


1 POETRIX – Informações Técnicas

CONCEITO

Poetrix (s.m.): poema com um máximo de trinta sílabas métricas, distribuídas em apenas uma estrofe, com três versos (terceto) e título.

FORMAS MÚLTIPLAS

São criadas em contextos comunicativos e constituídas como derivações do POETRIX; sua elaboração tem como características básicas o dialogismo, a intertextualidade e a polissemia da linguagem. Identificadas e reconhecidas pelo MIP como Duplix, Triplix e Multiplix são mesclagens de dois ou mais poetrix que se compõem com a participação obrigatória de variados autores e com suas poéticas formando sentidos complementares entre si (individualidade-interação-universalidade). 

2 CARACTERÍSTICAS DO POETRIX

2.1 O poetrix é minimalista, ou seja, procura transmitir a mais completa mensagem em um menor número possível de palavras e sílabas.

2.2 O título é indispensável. Ele complementa e dá significado ao texto. Por não entrar na contagem de sílabas, permite diversas possibilidades ao autor. 

12 de abr. de 2021

Dez dicas para um bom Poetrix, por Goulart Gomes


1. EVITE AS ORAÇÕES COORDENADAS. Um poetrix não é uma frase fatiada em três partes. Vamos tomar um exemplo:

TELEFONEMA

passei a noite em casa
esperando que ela ligasse
mas ela não ligou

Isso não é um poetrix, é a primeira oração de um texto! Está simplesmente horrível! Mas, notemos como ele poderia ficar bem melhor, se a idéia fosse expressada de outra forma:  

TELEFONEMA

noite em branco
telefone mudo
até o amanhecer


2. EXPLORE O PODER DO TÍTULO. Uma das grandes vantagens do poetrix é a existência do título, o que não há no hai-kai. Por vezes, ele pode ganhar uma característica de “verbete”, sendo definido pela estrofe. Suprimam o título e observem diferença que faz:

SEMÁFORO

pensei ser outra lua
olho verde contra o céu
fugaz, no meio da rua

Outro trunfo é que o título não entra na contagem de sílabas. Assim, alternativas criativas podem ser formuladas. Num exercício “exagerado” desta possibilidade, uso como exemplo:

ESTUDO SOCIOANTROPOLÓGICO DE UM COMUM CIDADÃO LATINOAMERICANO DE CLASSE SOCIAL DESFAVORECIDA, À LUZ DA NOVA ORDEM MUNDIAL, IMPACTADA PELA GEOPOLÍTICA DO PETRÓLEO, NUM ENFOQUE MÍSTICO-TRANSCENDENTAL, CORROBORADO PELOS IDEAIS FREUDIANOS-LENINISTAS, SEM ASPIRAÇÕES EPICURISTAS

nasceu
cresceu
desencarnou

3. MINIMALIZE. Corte tudo o que está sobrando. Escrever um poetrix é lapidar um diamante. Nenhum texto fica pronto “de primeira”. É preciso, sempre, trabalhá-lo. Literatura é 10% inspiração e 90% transpiração. Com o poetrix, apesar de pequeno, não é diferente. Exemplo:

ANTES:

DRAGÃO

com a cabeça no ar
e com os pés no chão
é um homem? não, um dragão

DEPOIS:

DRAGÃO

cabeça no ar
e pés no chão
homem? dragão

4. PESQUISE. Enriqueça o seu texto com informações pertinentes. Vejam este poetrix:

XENOGLOSSIA

na Planície de Sine-Ar
decifrar tua língua
em minha Torre de Babel

Após ter a idéia, fui à Bíblia obter mais informações sobre a Torre de Babel. Lá descobri que ela foi supostamente erguida na planície de Sinear. Em latim, “sine” quer dizer sem. A informação caiu perfeitamente: a língua, a torre, alguém “sem ar”... Uma pequena informação pode fazer uma grande diferença.

5. NÃO CONFUNDA POETRIX COM HAI-KAI. Para isso, é importante conhecer, também, os fundamentos do hai-kai. Para começar: se o tema do seu poetrix é a Natureza, desconfie. Pode ser que nasça um hai-kai, e não um poetrix.

6. UTILIZE FIGURAS DE LINGUAGEM. Em todas as formas poéticas, o uso de figuras de linguagem, metáforas, tropos e imagens enriquecem bastante o texto. Por vezes, é necessário “substantivá-lo”.

QUANDO A MARÉ ENCHER

Verdi no azul do mar
tocardo forró no piano
pra Netuno e Yemanjá

7. ACABE COM AS CONJUNÇÕES ADVERSATIVAS: Mas, Contudo, Porém, Todavia, Não Obstante, Entretanto, No entanto, geralmente não servem para nada em um poetrix, assim como a conjunção explicativa Pois.

8. NÃO FORCE RIMAS. Poetrix não é soneto. Às vezes pode-se dispensar completamente uma rima, utilizando-se bem o ritmo, a sonoridade e a riqueza semântica das palavras.

9. POETRIX NÃO É PROVÉRBIO. Muito menos, frase de pára-choque de caminhão. Evite coisas como (blargh!):

ARROCHA

mulher e parafuso:
comigo
é no aperto

(Só um texto explicativo, mesmo, para me fazer criar uma “coisa destas”! Que sacrifícios a gente não faz pela Literatura!)


10. O NÃO-DITO FALA MAIS QUE O DITO. Não pense que seu leitor é burro. Não dê tudo “mastigado”. Faça com que seu texto “dialogue” com o leitor, permita que ele faça sua própria “viagem” nas palavras:

ÁCIDO

a água furou a pedra
moinhos de amsterdã
a manhã será mais bela

HOLOKAWSTO

há o que não houve
retalhos de nylon
cogumelo atônito

E, para finalizar, não esqueça: O POETRIX é um poema composto de título e uma estrofe de três versos (terceto) com um máximo de trinta sílabas métricas.


Por Goulart Gomes

Fonte: https://poetrix.net.br/visualizar.php?idt=273564
Postado em 25/10/2006

3 de abr. de 2021

POETRIX: o Salto, o Susto e a Semântica - de Goular Gomes


"...penso no poetrix perfeito como um pequeno projétil
que nos atinge direto num órgão vital" (Sara Fazib)

Há quem veja as artes minimalistas – entre elas, o Poetrix – como artes menores. Como se fosse possível medir o valor de todas as pedras preciosas por seus tamanhos. Um cristal grande vale menos que um pequeno diamante e mesmo dois diamantes de igual tamanho podem ser avaliados diferentemente. Existem poetrix que valem mais que extensos poemas como, também, muitos deles não precisariam terem sido escritos. Dentre os vários elementos que podem aumentar ou diminuir os "quilates" de um poetrix, eu gostaria de falar, neste artigo, sobre três deles: o Salto, o Susto e a Semântica.

A cena é recorrente, o cinema hollywoodiano dela usa e abusa: o herói (ou vilão) está em fuga. Em sua perseguição, o inimigo. Após inúmeras infrutíferas tentativas de escape, surge o obstáculo: um abismo, uma ponte quebrada, o teto de um edifício, uma estrada inacabada. O que fazer? Morrer ou morrer? O protagonista da cena escolhe o risco. “A possibilidade de arriscar é que nos faz homens”, segundo o poeta baiano Damário Dacruz. Salta... para a salvação. O mesmo acontece com alguns poetrix. Por ser um texto breve, isso não quer dizer que ele deva ser lido com brevidade. É preciso querer-se captar as suas nuances, as pequenas particularidades de cada palavra, desde o título e a cada verso. Ele também tem o seu ritmo e intensidade próprios, possibilitados pela livre distribuição das sílabas em cada linha, conquanto não venham a ultrapassar o máximo de trinta sílabas. Existem poetrix que encaminham-se lentamente para o seu final como quem irá desencarnar por morte natural e, de repente, o Salto! Observem como isso foi bem elaborado por Sara Fazib (SP) no poetrix CARA METADE:

melhor par não faria
eu e essa minha falta
de companhia

ou em SONSAS, de Lílian Maial:

Estrelas
não dizem a verdade.
Elas piscam.

e ainda em GRÁVIDA, de Pedro Cardoso (DF):

No corpo da menina
a barriga cresce
como uma boca faminta

O Salto, no poetrix, subverte. O texto dialoga consigo mesmo, opõe-se, contrapõe-se, quase nega-se e, nessa dialética, ressuscita.

LinguaJá, meu mais recente livro de poesias, tem como subtítulo "O Território Inimigo", numa alusão ao nosso idioma, campo minado no qual o escritor tem que saber pisar com artimanhas. Voltemos ao filme no exato momento do salto do nosso (anti)herói. Stop! Imagem congelada. Agora solte, devagar, como num filme de John Woo. O leitor/telespectador, nesse curto espaço de tempo, viverá a brevidade da expectativa, mesmo sabendo, de antemão, o que acontecerá: ou ele cairá são e salvo, do outro lado, ou se espatifará. Mas, se não acontecer nem uma coisa nem outra? Se, digamos, o personagem simplesmente desaparecer no ar, teletransportado por alguma Ciência ou Magia? Eis o Susto. Nem, sempre, porém, quem deseja assustar atinge o seu intento. Sempre existem aqueles que “já viram de tudo” e “não se impressionam com mais nada”. Como os koans zenbudistas, que para alguns podem ser instrumentos de iluminação e para outros meras historietas sem graça, a intensidade do Susto depende muito mais de quem o recebe do que de quem o proporciona. Com o Susto, o poetrixta pretende surpreender, ainda que nem sempre o consiga. Um dois poetrix que mais me “assustaram” chama-se HEROESIA, também de Sara Fazib (que transformou-se num belíssimo grafitrix ilustrado pela poetisa Silvana Guimarães, disponível em www.poetrix.org):

de joelhos, reverente
provo a Tua presença
sarça ardente

Outro bom exemplo é NOVA EDIÇÃO, de Andréa Abdala:

conto da carochinha,
mulher de verdade
não goza de mentirinha

Foi também o que intentei fazer com o poetrix PESSOIX, inspirado em poemas de Fernando Pessoa e Ferreira Gullar:

um terço de mim, delira
um terço de mim, pondera
outro terço, ah!, quem dera

Eu estava utilizando o exemplo da fuga no cinema hollywoodiano, onde uma fuga é apenas uma fuga, não há nada por trás dela, seja a pé, de moto, carro ou caminhão. Mas não podemos dizer o mesmo quando tratamos do cinema europeu, onde tudo pode não ser simplesmente o que aparenta. Nele, uma cena de fuga pode estar metaforicamente simbolizando uma perda ou busca de identidade, uma inadequação social, um estado psicológico... ou patológico. Uma fuga, como a outra, mas dentro de um novo contexto idealizado. O poeta Gilberto Gil, na letra da música METÁFORA diz que “uma lata existe para conter algo, mas quando o poeta diz ‘lata’, pode estar querendo dizer o incontível.” Quando o poetrixta explora inteligentemente a riqueza semântica de algumas palavras, seja metaforizando, fazendo trocadilhos ou utilizando figuras de linguagem, o poetrix vai muito além das três linhas, ganhando uma vastidão de possibilidades. Quando Djalma Filho (BA), em LUSCO-FUSCO diz:

deitada,
quase apagada,
a noite armadilha

ele está fazendo isso. A palavra “armadilha” consegue deixar de ser um substantivo para tornar-se verbo, como suas sinônimas tocaia/tocaiar e emboscada/emboscar, permitindo outras (re)leituras do poetrix. A mesma coisa ocorre com estes dois poetrix meus, onde as palavras “mama”, “filho da mãe”, “presente” e “torres”, “rock”, “xeques”, “xadrez” permitem várias interpretações:

MAMA

aninho-me em teu ventre
filho da mãe
roubo-te o presente


TERRORISMO

as duas torres caem
nenhum rock, réquiem
xeques no xadrez

Poderão objetar: “sim, Goulart, isto tudo é muito singular; qualquer texto literário cresce quando conta com esses elementos” e eu “vos direi, no entanto”: para o poetrix, a menor (em tamanho) das linguagens poéticas, “crescer” é fundamental!

Machado de Assis, na apresentação do seu livro VÁRIAS HISTÓRIAS diz, com relação aos contos:

"O tamanho não é o que faz mal a este gênero de histórias, é naturalmente a qualidade; mas há sempre uma qualidade nos contos, que os torna superiores aos grandes romances, se uns e outros são medíocres: é serem curtos."

Isto é válido para o poetrix em relação à poesia, assim como o inverso também é verdadeiro: se tais elementos – Susto, Salto e Semântica – são importantes no texto longo, mas ainda o são no poetrix, onde não há tempo ou espaço para corrigir erros.

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(meus agradecimentos aos cúmplices: Ana Cristina Carvalho e Sara Fazib pelas "dicas" que contribuíram para a elaboração deste texto; a Damário Dacruz pela autorização para inclusão da sua citação e a Machado de Assis, por ser tão genial!)

Goulart Gomes
in: https://www.goulartgomes.com/visualizar.php?idt=409724

31 de mar. de 2021

PARA VIVER UM BOM POETRIX, por Goulart Gomes

PARA VIVER UM BOM POETRIX
(Goulart Gomes, parafraseando Vinicius de Moraes)


Para viver um bom poetrix, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e algum risco - para viver um bom poetrix.

Para viver um bom poetrix, mister é ser um poeta só daquela inspiração; pois ser de muitas, poxa! é de colher... - não tem nenhum valor.

Para viver um bom poetrix, primeiro é preciso sagrar-se poetrixta e ser de sua idéia por inteiro - seja lá como for. Há de fazer do corpo uma morada onde clausure-se a musa amada e postar-se de fora com uma caneta - para viver um bom poetrix.

A pitada e o ponto, por Aila Magalhães

Quem cozinha conhece o segredo de um bom poetrix.

Não há receita no mundo capaz de ensinar o tamanho certo da pitada, a exata intensidade da mexida no tacho, a precisão do tempinho a mais no fogo. É tudo decidido no olhar cheio de interesse, no cheiro que se espalha pela cozinha, na ponta da língua...

Quem nunca se maravilhou perante um prato, surpreendido na descoberta de um tempero tão sutil quanto imprescindível? Assim também ocorre com o poetrix. Um título, três versos e trinta sílabas? Não basta! Há que se acrescentar pitadas de amores e humores e se mexer com jeito para não desonerar o molho.

A poesia por um trix, por Aníbal Beça

Trace três versos triscando o toque do temporal mínimo oriental de um santo Bashô, que baixou na Baixa do Sapateiro para buscar no azeite de dendê e na pimenta malagueta seu cavalo-de-santo, temperado no mar da Bahia, Oropas, França e Japão.


Dormiu cem anos de solidão na rede latino-americana, na cesta das tormentas, entre a sesta dos excluídos e escolhidos, para dar o salto do canga-pé universal. Falo de um personagem criativo e criador que, como xará onomástico de ex-presidente deposto por golpe, atende e diz-se Goulart Gomes.

O cognato: use e abuse de aliterações, assonâncias, rimas, símiles, onomatopéias, metáforas, metonímias, e outras que tais do inferno gramatical, mas podem chamá-lo poetrix. Um pelo outro, mescla-se o troco, ganha-se em dobro de corda e caçamba bem amarradas. Goulart e poetrix, não se largam. São um só: pai, filho e espírito santo.

O verso é como remédio: três em um. E cura cotovelo de apaixonado, espinhela caída de donzela, males da cornucópia, bochicho de esquina de mal-dizer & bem-querer, desigualdades da cólera social. Tudo em drágeas de colorido humor, no senso exato, que não subestima, inteligente, transgressor et, por cause, libertário.

No palimpsesto do verso, o reverso que retorna às liças medievais pela boca soteropolitana-gregoriana: o canto da boca do paraíso e do inferno
tropicais, de mel e fel, na síntese da Nova Trova, nas palavras da tribo de hoje. Daqui e d'além mar.

Um fenômeno que tomou de assalto as caravelas de bucaneiros que navegam pelos mares sistêmicos-internâuticos. De fato e de direito, pelo mérito, já se faz história, como primeiro movimento universal saído dessa rede. Não há como deletar, Tem-se que engolir o gênio baiano.

Morasse Goulart em São Paulo, ele já seria alçado parelha ao movimento dos concretos, do qual não nega ser caudatário. Sucesso no Brasil é perigoso. E quando se espalha babel, as línguas de fogo mexem com zelos-celos de salieris de atalaia. O Tom Brasileiro, afinado, já descobrira: " É um insulto" .

Que seja um insulto. Mas um insulto que o mundo já adota como um soco
renovador acabará por nocautear os misoneístas renitentes É ver para crer.

Os neofóbicos que me perdoem, mas o novo é fundamental.

Não gostava, como diria um poetrixista português, de me debruçar sobre as "amargas". O instante é de festa, de comemorar na dança das palavras. Pois então saudemos esta antologia com as alvíssaras que ela carrega. Que a Boa Nova, desça aos infernos e ascenda aos céus, com a mesma manemolência que fez de Pastinha um mestre:

Sai da rasteira
do tombo no seu quilombo -
Ás da capoeira!
Aníbal Beça

Fonte: https://poetrix.net.br/


Apresentação da I Antologia Poetrix, por Alice Ruiz

Dizem os sábios que: o UM é a energia criadora, o Yang, o masculino; o DOIS, a materialização da energia, o Yin, o feminino; o TRÊS, resultado do encontro deles. Portanto, mágico.

Na poesia, os três versos sempre acharam alguma forma de se impor como forma, nem que fosse como estrofe. Até, enfim independentes, atingirem seu apogeu no haikai. 

Mas como poesia é liberdade, nova independência surgiu. 

E agora, diziam os poetas, que fazer com os tercertos que não seguem as regras do haikai mas insistem em acontecer? 

Eis que o profeta, digo, o poeta Goulart Gomes, tirou-os do limbo em que viviam, por falta de batismo, inventando a palavra Poetrix. 

Essa antologia é apenas o começo da história feliz do terceto que se salvou por um triz. Digo, por um Poetrix...

Alice Ruiz

Fonte: https://poetrix.net.br/

Breve resumo da trajetória do Poetrix

O POETRIX foi criado pelo escritor baiano Goulart Gomes e tem sua origem na publicação do seu livro TRIX - POEMETOS TROPI-KAIS em 1999, durante a III Bienal do Livro da Bahia, quando também foi publicado o  I MANIFESTO POETRIX, 

Em 2000 foi criado o MIP - Movimento Internacional Poetrix, sob coordenação de seu criador e  foram nomeados poetrixtas coordenadores em diversos estados do Brasil e também em Portugal, Argentina, Estados Unidos, Venezuela, Colômbia, Itália e Espanha.

O MIP realizou oito Concursos Literários Internacionais e publicou seis coletâneas com a participação de autores brasileiros e estrangeiros. Estimulou a publicação de diversos livros e promoveu a divulgação de Poetrix através da Internet.

Vinte anos depois, o MIP foi extinto e em seu lugar foi criada a Academia Internacional Poetrix, em 01/07/2020.

POETRIX: UMA PROPOSTA PARA O NOVO MILÊNIO, por Goulart Gomes

Em 1984 a Universidade de Harvard (USA), solicitou ao escritor e crítico Italo Calvino que elaborasse uma série de palestras a respeito das qualidades da escritura. Ao todo seriam seis palestras. Contudo, em 1985, este escritor nascido em Cuba, mas radicado na Itália, viria a falecer, deixando prontas apenas cinco palestras. Estas palestras foram reunidas em um livro publicado no Brasil pela Companhia das Letras, sob o título “Seis Propostas Para o Próximo Milênio”.

Com sua vasta cultura, Calvino discorre com bastante elegância e propriedade acerca destas “qualidades” - Leveza, Rapidez, Exatidão, Visibilidade e Multiplicidade - fazendo um rico passeio pela literatura universal, desde os clássicos até os escritores contemporâneos.

II MANIFESTO POETRIX - 2002

Dos males, o menor!

Toda vanguarda será retaguarda: se não podemos ser eternos, sejamos pós-modernos; se não somos pós-doutores, sejamos pós-autores. Todas as ideologias estão mortas, todos os sujeitos fora de lugar.

Viva o Minimalismo e vamos flanar! O poetrixta desfolha a bandeira: descerrar é melhor que dissertar.

Nada se cria, tudo se copia, concluíram Bakhtin e Chacrinha. Então, vamos hiper, intra e intertextualizar, sejamos dialéticos, digitais e dialógicos. Queremos a inter/ação, queremos o simulacro, a paródia, o pastiche, o duplix, o triplix, o multiplix, o grafitrix, o clonix, o concretrix! Viva a ciberpoesia!

Fazer poetrix não é fatiar uma frase em três partes. Viva a insubordinação gramatical, a desobediência civil! Abaixo as orações coordenadas e subordinadas!

Fora do título não há salvação.

Não mais que trinta sílabas para dizer o máximo.

E viva o canibal! Viva o caeté que comeu Sardinha e viva o Cabral!

Vamos privilegiar a inteligência do leitor! Que ele morda, mastigue, engula e faça a digestão. Que se vire! Abaixo os derramamentos da poesia fast-food! Dizer muito, falando pouco. Concisão e coerência. Exploremos os significados polissêmicos das frases, a riqueza semântica das palavras, valorizemos as metáforas.

Queremos o salto
o susto
a semântica
a leveza
a rapidez
a exatidão
a visibilidade
a multiplicidade
a consistência

Queremos o Século XXI! Vamos acordar o Novo Milênio!

O poetrix é um projétil que se aloja na alma. O poetrix é um vírus em nossa memória discursiva. É a suprasíntese.

Viva Bakhtin, Kristeva, Calvino, Oswald e Drummond!

E viva a Poesia!

E viva o Poetrix!

Viva a alegria e viva um planeta chamado Bahia!

Viva eu, viva tu e viva o rabo do tatu!


Maior é Deus.

Goulart Gomes

Bahia, Brasil, 28/07/2002.

MELHORES POETRIX DOS ANOS 2001 A 2007

MELHORES POETRIX - Eleitos pelos integrantes do MIP
Fonte: poetrix.net.br

2001

PESSOIX
(Goulart Gomes)

um terço de mim delira
um terço de mim pondera
outro terço: ah! quem dera!


2002

ORTOGRAFIA 
(Anthero Monteiro)

uma gaivota só
um til sobre a palavra
imensidão


2003

Fútil 
(Armando Leal)

sinto-me vazio e escrevo.
as letras parecem pedras,
e doem-me os gestos.


MORTE 
(Anthero Monteiro)

uma cadeira vazia na alameda
sentada numa tarde de outono
a olhar o meu ponto de fuga


2004

AGENDA CHEIA
(Eliana Mora)

Marquei encontro comigo.
E [como sempre]
não fui.


2007

PRÉ-NATAL 
(Marilda Confortin)

Dilato, contraio, ardo.
Estou prestes a parir
mais um ano bastardo.

I MANIFESTO POETRIX -1999



O I Manifesto Poetrix  foi publicado no livro TRIX POEMETOS TROPI-KAIS, de Goulart Gomes (Bahia: Pórtico Ed.,1999), premiado com Menção Especial pela Academia Carioca de Letras e União Brasileira de Escritores-RJ, em 2000


Alguns conceitos foram modificados posteriormente pelo MIP- Movimento Internacional Poetrix. 






Foi Aníbal Beça, um dos maiores pesquisadores brasileiros de Hai-Kai, quem gentilmente me falou: "Goulart, pode chamar seus inventivos tercetos do que quiser, menos de Hai-Kais". E ele estava absolutamente certo. Não podemos dizer que suco de uva é vinho sem álcool. O Hai-Kai (ou Haiko) é uma milenar arte oriental, que vem aprimorando-se com o passar dos séculos. Mexer na essência das coisas significa criar uma coisa nova, diferente da anterior.

Assim, necessariamente, o Hai-Kai deve possuir 17 sílabas, divididas em 3 versos de 5, 7 e 5 sílabas; conter alguma referência à Natureza; referir-se a um evento particular e ater-se ao Presente.

O que apresento neste livro - e que também é feito por muitos outros poetas - é o que agora proponho se chame POETRIX (poe, de poesia, poema; trix, de três, terceto), ou seja, a poesia em três versos, o terzetto, originalmente chamado na Itália.

Mas não apenas isto: venho propor, também, um gênero com características (não, regras) bem definidas e abrangentes:

1. No POETRIX, o título é desejável, mas não exigível. Ele exerceria uma função de complementaridade ao texto, definindo-o ou sendo por ele definido.

2. Não existe rigor quanto ao número de sílabas, métrica ou rimas no POETRIX, mas o uso do ritmo e da similaridade sonora das palavras, sim.

3. O uso de metáforas e outras figuras de linguagem são uma constante no POETRIX, assim como a criação de neologismos.

4. A interação autor/leitor deve ser provocada através da subliminaridade do POETRIX.

5. O POETRIX é necessariamente uma arte minimalista, ou seja, ele procura transmitir a mais completa mensagem com o menor número de palavras.

6. O POETRIX considera Passado, Presente e Futuro como uma só dimensão: TEMPO, podendo ser utilizado indistintamente.

7. No POETRIX o observador (autor), as personagens e o fato observado podem interagir, criando condições suprarreais ou ilógicas ("non sense").

O POETRIX é tipicamente urbano. Ele também aproxima-se das leituras visuais, concretas, do epigrama e do caligrama, podendo ganhar formas animadas. Um experimentalismo deste tipo de POETRIX foi por mim realizado com a produção do livro em disquete MAIS FRACTAIS, em 1996.

O POETRIX vai muito além do ascetismo espartano do Hai-Kai. É isso o que trás este livro: poemetos tropi-kais, leves como quem vive abaixo da linha do Equador. Convido os poetas a exercitá-lo e os leitores a apreciá-los.

A capa deste livro é uma homenagem a Pablo Picasso, que também descobriu, em 1907, um jeito diferente de ver o mundo.

Muito obrigado.

Goulart Gomes


A origem do Duplix, Triplix, Multiplix - por Pedro Cardoso

Duplix, Triplix e Multiplix são formas poéticas derivadas do Poetrix, feitas por duas, três ou mais pessoas, respectivamente. 

Transcrevemos correspondência enviada pela Tê Soares, uma das criadoras do DUPLIX para a nossa lista de intercâmbio (extinto grupo poetrix no yahoogroups), dando explicações sobre as mesmas, alguns exemplos e as regras das formas múltiplas.

____________________________


Caros poetrixtas:

O Poetrix surgiu de uma brilhante idéia do poeta baiano Goulart Gomes. No nosso entender, o brilhantismo de sua "criação" foi a formação de um grupo de escritores via Internet, em que todos recebem, ao mesmo tempo, os diversos poemas como se fosse uma mesa redonda. Esta troca de e-mail permitiu um maior entrelaçamento de parte a parte. É importante dizer que o grupo é formado por poetas de vários países, o que, com certeza, dá ao poetrix, uma força maior.

Desse contato, nós, Pedro Cardoso e Tê Soares, começamos a trocar poetrix e a perceber que havia um grande sintonia na compreensão dos conteúdos e nas idéias. Um dia, Pedro encaminhou um poetrix e a Tê não resistiu. Para mexer com ele e sair brincando com as palavras, criou e juntou um poetrix e pronto! Era um autêntico duplix!

O Duplix não pode ser comparado com os tankas, essa modalidade de poetrix tem que ser elaborada a partir de um terceto pronto. Tem de ser um desafio, ser feito por dois poetas, ter rimas e vida própria. É quase um casamento, onde cada um dos dois já existe, faz sentido e tem seu papel. Ao juntarem-se, formam um casal - o Duplix - que, igualmente, é um ser completo, composto de duas partes entrelaçadas e fazendo um novo sentido. Para saber se dois poetas compuseram um duplix é simples: leia o primeiro poetrix independente do seu parceiro. Leia o do parceiro. Ambos tem de ser compreendidos sozinhos e, juntos, estarem no mesmo assunto, mas sendo outro terceto.

O nosso objetivo é lançar o DUPLIX e, agora, também o TRIPLIX, que, em verdade, são apenas uma derivação do poetrix, pois terão que ser obrigatoriamente apresentados de forma separada e em conjunto, ou seja, não poderão ser feitos por uma só pessoa. Essa é a regra de ouro e obrigatória para que nos mantenhamos fiéis à origem e finalidade de ambos. Além disso, o duplix (e cada um dos duplix que compõe um triplix) não poderá ter mais que sessenta silabas e deverá apresentar as mesmas rimas do poema original para garantir o ritmo e a musicalidade (não importa que sejam na mesma ordem do primeiro e nós temos nos perguntado se isto é viável ou é melhor deixar a rima a critério do escritor, mas como estamos apenas nascendo, ainda haverá muito tempo para errar e acertar...)

O duplix é, na verdade, um desafio. Acreditamos que a tarefa não seja das mais fáceis, mas é maravilhoso ter intimidade suficiente com as palavras para brincar com elas, além de ser pura arte...

Beijos da Tê para os meninos, do Pedro para as meninas e abraços para todo mundo.
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O PRIMEIRO DUPLIX:


EU e EU
Pedro Cardoso // Tê Soares

Menino carente // menina contente
feito pinto no lixo // feito quem brinca de cochicho
rega a vida, enganando a boca // negando a dor, veemente e louca



DUPLIX PESSOIX

um terço de mim delira // a vida me convida
um terço de mim pondera // o medo me atrela
outro terço: ah! quem dera! // sou inteira quimera...

Goulart Gomes // sara fazib




DUPLIX FLAGRA

Me pegaram de jeito // vigilantes tecelãs
osculando a manhã tecida // nos teares da alvorada,
a ouro em pó e praia // sereias douradas.

Amélia Alves // Walter Cabral de Moura



TRIPLIX FLAGRA



Me pegaram de jeito // vigilantes tecelãs // guardiãs da madrugada
osculando a manhã tecida // nos teares da alvorada, // na fina malha do tempo
a ouro em pó e praia // sereias douradas / cavalgando o vento

Amélia Alves // Walter Cabral de Moura // sara fazib




O PRIMEIRO MULTIPLIX




FEROHORMÔNIO MARINHEIRO

Pressinto-te no ar, // [ no mar ] // navego lentamente //, velas pandas
Farejo-te no vento. // [ sedento ] // me entrego, // em liberdade,
Qual bicho ao relento. // [ me rendo ] // como se você fosse uma deusa.// grega.

Sávio Drummond // [sara fazib] // Pedro Cardoso // fausto



REGRAS DO DUPLIX

1 - DEFINIÇÃO

O duplix foi criado pelos poetrixtas Tê Soares e Pedro Cardoso. É uma composição poética elaborada a partir da junção de dois poetrix. Cada um dos versos dos poetrix que o compõem devem ser harmônicos, dando um sentido único. Exemplo:

Juras Ausente


No dorso amante,//do homem nu
a mão ausente//recende...
é dor só.//Solidão.

Tê Soares // Pedro Cardoso


2 - ESTRUTURA

2.1 - Chamamos de POETRIX RAIZ (PR) o que deu início ao duplix e de POETRIX COMPLEMENTAR (PC) ao que resultou no duplix.

2.2 - Os versos dos poetrix que compõem o duplix são graficamente separados por duas barras(//), ao sendo impedido que outras formas de diferenciação sejam adotadas como (fontes, cores etc)

2.3 - Na elaboração dos versos é desejável a existência de verbos para que a estrutura sintática, sendo obedecida, facilite na clareza e compreensão, embora não seja proibida a seqüência de palavras da mesma classe gramatical.

2.4 - O duplix deve conter, no máximo, 60 sílabas para que não se perca a concisão e suas características.

2.5 - A pontuação deve fazer sentido tanto individual quanto duplamente. Ela deve ser usada em cada um dos poetrix para que eles tenham sentido, e, no entanto, obrigatoriamente, estar colocada de tal forma que estejam inseridas corretamente também quando da leitura do todo do duplix. A alteração da pontuação do poetrix raiz, bem como a quebra de versos, só poderá ser feita com o consentimento prévio do autor do Poetrix originário.

2.6 - Fica livre o uso ou não de rimas para preservar a liberdade de criação poética.


3 - DO TÍTULO

O título do poetrix complementar, para formar o duplix, deve formar um novo título único, que faça sentido.


4 - DO TEXTO

O texto do poetrix complementar, para a formação do duplix, não precisa dar continuidade à idéia original, podendo ter um sentido adverso ao POETRIX RAIZ.


5 - DA FORMA

5.1 - Um mesmo poetrix, dada a liberdade de expressão e de criatividade, pode gerar tantos duplix quantos forem desejados.

5.2 - Devem ser respeitadas, sobretudo, a liberdade para a criação, forma e a escolha de parcerias, ficando porém obrigatório constar o nome de cada um dos autores;

5.3 - As relações entre os tercetos são abertas à criação e cada poetrix, dentro do duplix, bem como este último como raiz de um triplix (que terá no máximo 90 sílabas), podem gerar novas composições livremente tanto à direita quanto à esquerda ou ainda, ao centro.

5.4 - Diferentes modalidades de composição podem ser criadas a partir da junção dos poetrix como: o triplix (três poetrix ), o multiplix (quatro ou mais poetrix), o classificatrix (classificados poéticos na forma de poetrix ou duplix), o clonix e ainda, as cirandas de poetrix, que podem ser encadeadas (um poetrix em resposta ao outro).



6 - FORMAS MÚLTIPLAS DE POETRIX


TRIPLIX: Idêntico ao duplix, mas formado por três poetrix.

MULTIPLIX: Idêntico ao duplix, mas formado por quatro ou mais poetrix.

CLONIX: Poetrix elaborado a partir da substituição de poucas palavras em um Poetrix Raiz

INVERTRIX: Poetrix elaborado a partir da inversão de palavras em um Poetrix Raiz, sem subtrair nem acrescentar outras.



7 - TIPOS DE DUPLIX

7.1 - DUPLIX SIMPLES: formado pela união de dois poetrix, podendo o PC ser colocado antes ou depois do PR.

7.2 - DUPLIX COMPLEXO (OU MISTURIX): Formado a partir de dois poetrix pré-existentes que, devido às coincidências de tema, proximidade de intenções e complementaridade formam uma nova composição poética. Pode ser feito por um terceiro poetrixta, juntando poetrix de dois outros poetrixtas ou pelo próprio autor, juntando dois poetrix seus (AUTODUPLIX).

7.3 - DUPLIX RARO: aquele em que alterada a disposição PR//PC para a posição PC//PR apresenta outro sentido ao final da composição.


Fonte: https://poetrix.net.br/