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21 de out. de 2023

CARTA DE FRANCISCO JOSÉ



NÃO ERA SEXTA-FEIRA

Crusoé viu pegadas femininas
havia ossos na areia
foi arte de terça-feira

Francisco José



TROCA EPISTOLAR

sou teu ano estio
és meus dias sáfaros
se chover depois da morte eu volto

Francisco José



APOPTOSE GERAL

sou um relógio carente
tenho os minutos contados
bigue-bangue!

Francisco José




Querida terça-feira. Minha primeira carta é para ti, noite de 10 de outubro de 2023. Sei que os beijos escritos não podem atingir os lábios da vida, são fantasmas que viajam na escuridão do tempo. Em busca de uma fada, não a acordam do sonho dogmático da sua existência bela. Minha musa é de uma outra década, separam-nos os costumes e as distâncias vencidas pelo espaço das vivências de uma monja. 21:37 crava o meu relógio. E o teu?... Marca temporal do nada em nós, marco atemporal do eu sem fim! Morro de uma agonia rara, tenho o organismo combalido pela insidiosa patologia da vida, meu corpo, em decomposição orgânica, foi diagnosticado com a fatal doença do envelhecimento, preciso ardentemente da tua saudável juventude para curar-me. Escaramuceio no esboroar amorfo do mundo até ser executado pelo tiro da morte, mas antes peço que sejas o lenitivo do meu drama particular. Que essa apoptose programada nunca chegue de fato a uma necrose irrevogada. Beija-me e me salvarei da morte certa, não me permita esperdiçar tanta vida. Seja-me uma esperança inesgotável, não permita que a minha esquizofrenia se torne letal a ponto de autodestruir-me só para matar também a representação onírica de tua alma em mim. Pelo fenômeno da autossugestão, contraia também minha doença antes do tempo, imagine que a adquiriu a ponto de envelhecer rapidamente e morrer no dia da minha morte. A não ser que, exatamente à meia-noite nos partamos ao meio, e tu nasças para o dia enquanto eu parta para o outro lado. Mas durante algum tempo ainda manter-me-ei de pé, insensível às injeções mortais com as quais a vida mata os velhos.




Francisco José Soares Torres