29 de jan. de 2024

ENTREVISTA DE ANGELA BRETAS

 






ANGELA BRETAS

Acadêmica ocupante da cadeira 4 da AIP


Entrevista concedida a Goulart Gomes

1. Fale um pouco sobre você, sua vida pessoal:

 “Sou quem sou, simplesmente mulher não fujo e nem nego… Sou uma mulher temperada, não deixo o sal da vida salgar o meu lado doce”. Além da escrita sou apaixonada por artes visuais, especialmente a fotografia de natureza, tenho um olhar fotográfico e poético, consigo enxergar a beleza em tudo…  Sou irmã, tia, amiga, engraçada, estilosa, curiosa, ativista comunitária, voluntária, pecuarista, dona de casa, esposa, mãe de humanos, de jardins, hortas, plantas, poesias e pets… Nasci e vivi minha infância em Santa Catarina, parte da minha adolescência em Rondônia (família pioneira da região), lá conheci meu esposo, pai dos meus dois filhos Casamos e fomos juntos para os Estados Unidos, no ano de 1985. 

 2. Como se deu sua transição para os EUA? 

Como foi essa aventura que deu certo? Uma longa história que já foi descrita no meu livro Sonho Americano. Lá tive que me adaptar a uma vida completamente diferente, aprender nova língua, me acostumar com o clima, lá passei frio, sofri discriminação, xenofobia, assédio sexual, solidão… mas foi lá também que me tornei mãe, estudei (sou formada em Broadcasting), trabalhei em multinacionais, aprendi novos costumes, escrevi meus primeiros poetrix, publiquei livros, coordenei antologias, fui colunista social, repórter investigativa… Ufaaa! Nem acredito o tanto que já fiz, cansei só de lembrar. Atualmente possuo dupla cidadania, brasileira/americana e divido minha vida entre o aqui e o lá… Lá chamo de Flórida, onde residi por mais de duas décadas. Aqui no Brasil, em Rondônia, onde vivo, resido na zona rural. Duas residências paralelas e completamente distintas, que fazem parte da minha vida e me tornam o que sou, onde encontro inspiração para escrever.

 3. Como foi o seu início na literatura? 

Desde sempre gostei de escrever e de jornalismo. Com o passar dos anos e a mudança para outro país, a literatura e a leitura passaram a se tornar mais presentes na minha vida. Estando fora do Brasil e tendo que aprender outra língua me apeguei a leituras de livros em inglês. Assim que cheguei nos EUA fui para Massachusetts, Boston. Lá necessitava usar o metrô para me locomover e constatei admirada que a maioria dos presentes possuía um livro nas mãos, uma era em que não havia celulares e os americanos viviam mergulhados em leituras. O ar tinha cheiro de livros, de cultura, diariamente me via cercada por estudantes da Harvard, MIT, entre outros, que usavam o mesmo trajeto diário. Naquela cidade (Boston) há também uma das melhores e mais antigas bibliotecas do país (Copley Square). Lá eu tinha acesso a milhares de livros, gostava de ir lá e me perder entre livros e mais livros nos jardins seculares do local. Assim, foi como, no início aprendi parte do meu inglês. Posteriormente, já na Flórida, consegui uma bolsa de estudos e me formei.  Comecei lendo livros de história dos EUA, queria aprender tudo sobre aquele país. Depois passei a ler os clássicos de Shakespeare, li vários do Stephen King e as poesias de Mark Twain, Edgar Alan Poe, entre outros. Um dia fui comprar um casaco de frio em um brechó, em Boston, possuía somente vinte dólares no bolso. Achei o casaco, que custava quinze dólares, e ao me dirigir ao caixa avistei uma máquina de escrever, destas antigas, pesadas, de ferro. Esta máquina custava os vinte dólares. Desisti do casaco, optei pela máquina de datilografia. Recordo que carreguei aquela máquina pelas ruas geladas de uma manhã de inverno. Usava uma camiseta de mangas curtas. Entretanto, não senti frio. Abraçada à máquina sabia que ali iniciava a escrita da minha história de vida. Seria minha terapia, deixaria um diário de minha rotina. E assim nasceram as primeiras poesias, em Boston, escritas nesta máquina. Várias delas foram publicadas em meu livro de verso e prosa “Conversando com as Estrelas”. Posteriormente este diário foi adaptado para um conto, com a inclusão de narrativas de outros imigrantes que, assim como eu, estavam em busca do “sonho americano”, título do meu livro de contos, também publicado e divulgado nos EUA. Frutos desta máquina adquirida em um brechó.  Após alguns anos em Boston, a comunidade brasileira foi crescendo e foi fundado um jornal comunitário “Brazilian Times”. Fui colunista deste jornal por duas décadas, escrevendo desde a história dos EUA, para que os novos imigrantes pudessem conhecer também um pouco sobre o novo país. Dicas de passeios, de serviços comunitários e, é claro, com um espaço para a poesia, principalmente o poetrix. Nestas três décadas, em Massachusetts e Flórida, publiquei três livros e fui curadora e idealizadora das antologias “Brava Gente Brasileira em Terras Estrangeiras“ volumes 1 e 2. Antologias escritas exclusivamente por imigrantes brasileiros residentes no exterior. Fundei uma biblioteca comunitária. Promovi encontros lítero-culturais, concursos de poesia… enfim, levantei a bandeira do hábito da escrita aos brasileiros no exterior. Com orgulho recebi inúmeras condecorações internacionais, participei de encontros literários e bienais nos Estados Unidos, Japão e Itália. Recentemente fui empossada como “Imortal vitalícia / Doutora Honoris Causa” da ALB - Academia de Letras do Brasil - SP, por ter contribuído com a divulgação e propagação da literatura brasileira em terras estrangeiras. 

 4. Que autores são as suas maiores influências? 

 Li alguns livros na adolescência, projetos de escola, que me marcaram: “Vidas Secas“, de Graciliano Ramos, “Grande Sertão Veredas”, de Guimarães Rosa, e “Iaiá Garcia”, de Machado de Assis. Lembro que com este último ganhei o primeiro prêmio da escola, em leitura e interpretação. Na poesia, Drummond, Cora Coralina, Adélia Prado, Cecília Meirelles, Ferreira Gullar, Vinicius, Patativa do Assaré. Depois, já nos EUA, conheci diversos estilos e nacionalidades: Bashô, Emily Dickson, Gabriel García Marquez, Walt Whitman, Nietzsche, Ernest Hemingway, Wordsworth e outros …

5. Quando começou a escrever poetrix? Como o conheceu?

Conheci o poetrix em 1999, morava nos EUA. Nesta época escrevia para o jornal publicado para a colônia de brasileiros e havia um pequeno espaço no rodapé onde eu escrevia haicais, pensamentos, frase do dia etc. Fui induzida a procurar o grupo que acabava de ser formado, o MIP, pelo amigo escritor e haicaísta Aníbal Beça, e a conhecer o POETRIX. Desde então sou uma amante deste pequeno. Desde seus primórdios tenho carinho em afirmar que divulgo o poetrix internacionalmente.

 6. Como você vê o poetrix hoje e no futuro? 

Poetrix é ágil. A velocidade do tempo urge leituras rápidas e o poetrix consegue passar a mensagem em questão de segundos, com uma única leitura, ele é veloz e irá longe. Conseguirá acompanhar a velocidade dos tempos. 

 7. Como você vê a interação entre o poetrix e o ensino didático? 

Importantíssima a divulgação, novos leitores serão os poetrixtas de amanhã, é também importante para a inclusão do gosto pela leitura. Já tive oportunidades de divulgar nossos livros de poetrix, tanto para alunos do ensino médio quanto para professores, em rede municipal de Rondônia, e o resultado foi surpreendente, eles simplesmente amaram. 




 8. Que acha do uso da inteligência artificial da literatura? 

Não parei para pensar, nem para pesquisar sobre o tema. Tenho a inspiração como algo divino, humano, vem da alma do poeta. Não acredito que tecnologia alguma possa ultrapassar ou chegar aos patamares da inspiração humana. Para análises de texto, talvez tenha valia, para criação não. 

 9. Que autor(es) você destacaria no atual cenário da literatura? 

São vários e a cada dia surgem mais. Posso citar duas leituras que me fascinaram: Conceição Evaristo, “Ponciá Vicêncio” e  Luís Fernando Veríssimo,  “Diálogos Impossíveis“. No poetrix destaco o acadêmico Pedro Cardoso.

10. Que lugares inspiram você? 

Qualquer lugar, a inspiração pode brotar qualquer hora do dia ou da noite… vem da alma, de estar em paz comigo e com todos. Entretanto ela desperta mais quando estou cercada da natureza, bichos ou plantas. Pode ser no campo, cidade ou praia. Sou inspirada quando estou só… sem humanos por perto.

 11. Como você vê a questão do “lugar de fala”?

 Acredito que todo ser humano, independentemente de sua cor ou credo, tem o direito à fala. Então, é superválido, pois é uma forma de expressão onde o protagonista é aquele que fala. Seja para defender a si ou aos outros. Há um ditado que é aplicado por lei nos EUA: “Meu direito termina onde o seu se inicia…“. Então, todos temos o direito de defesa, o poder da fala.

 12. Você escreve à mão ou escreve direto no computador? 

Tenho um bloquinho que às vezes carrego comigo, mas ultimamente estou escrevendo diretamente no celular. Envio para mim mesma, via WhatsApp, no momento que crio. De vez em quando faço uma limpeza, seleção e organizo o texto no computador.

 13. O “politicamente correto” dificultou a produção literária? 

Sim, sou contra o “politicamente correto”, uma censura disfarçada. Há palavras que foram banidas e outras sendo inventadas. Tudo em nome de partidarismos e idealismos. A língua portuguesa não deveria ser “importunada”, mesmo com todos os seus pejorativos e nomes.

 



14. Como tem sido sua experiência como membro da Academia Internacional Poetrix? 

É um orgulho ocupar a cadeira 4, ser fundadora, uma” Dinotrix”, e estar presente desde seu início. A Academia surgiu para que o Poetrix pudesse realmente ser reconhecido a nível mundial. Está sendo gratificante constatar o crescimento da AIP, com a inclusão anual de novos acadêmicos. Acredito que estamos no caminho certo. 

 15. Gostaria de fazer um comentário final? 

Agradeço a oportunidade em poder abrir minha vida e compartilhar com todos vocês. Se você leu até aqui convido-o a seguir minha página no Instagram @angelabretas_photography ou no Facebook “Poesias & Prosas by Angela Bretas“. Finalizo com alguns poetrix escritos nos últimos 23 anos.



Ma(temática)

Não adiciono
Sou
Sub-traida



— Guardiã

A vela
Vela
A velha

__



Na pelada

Moleque fominha
Pés arrancam, barriga ronca
Tem fome… de bola


Súplica de Mãe

Roga ao Pai
O filho já se perdeu
Espírito Santo que o proteja

——

Tá Russo

Guerra sem eira
Briga partidária, parteira
Putin que pariu

——-

Alma Desdentada

dentes perfeitos
sorriso forçado
espontaneidade banguela


Cabuloso

vidas perdidas em vão
nuvens de homens atacam
humanos encurralados

——

Sina de Poeta

velha me vi, sem tinta
cabelos de algodão
canetas na mão

——

Ostracista

Só, em casa
Vira Casca
Caramuja-se...

———

Alagada

perdida, só lama e lodo
confusa, sem toldo ou cama
…cheia da cheia que enche




15 comentários:

Giovanna disse...

Adorei!😍

Dirce Carneiro disse...

Tudo tem sua hora não é mesmo Angela Bretas? Aconteceu sua entrevista e está maravilhosa. Parabéns ao Goulart Gomes pela condução e à poeta Angela Bretas pelas excelentes narrativas.

Lucia Maria Donizete Smith disse...

Já conheco o trabalho da Angela desde o ano 2000. Uma pioneira das letras na colônia de brasileiros nos EUA. Muito orgulhosa desta guerreira que além de ótima escritora é uma pessoa amiga e do bem . Palmas por sua perseverança .

Francisco Guimarães disse...

Gostei. A primeira vez que ouvi a palavra poetrix foi por vc. Não conhecia até então. Gostei da velocidade sem perder a essência e a profundidade.

Pedro Cardoso disse...

Oi Angela, sua entrevista é um poema encantador!

Andréa Abdala disse...

Só desejo mais coisas boas na sua vida!... Parabéns pela trajetória e tudo mais de bom que vier a conquistar.

Marilda Confortin disse...

Angela é autêntica e guerreira. Um dos Poetrix que mais me impressionou quando conheci o MIP foi o seu mas(temática). Usei-o em oficinas de poesia várias vezes. Era lindo ver a reação das pessoas. Gosto da escrita e da história da angela. Um um verdadeiro sonho americano contado em seu livro. Ótima entrevista, poeta amiga. Sucesso pra ti! 💯🌸

Anônimo disse...

Sempre bom ler a Angela. Adoro o Poetrix que ela faz num sopro só!

Angela Bretas disse...

Agradeço a todos que tiraram um tempinho para ler esta entrevista. Gratificante saber-me lida ... 😘✍️

Bianca Reis disse...

Angela, muito rica a sua história na literatura! Sou fã do seu estilo. parabéns.

José de Castro disse...

Parabéns pela entrevista, Angela. Muito bom conhecer um pouco mais sobre você... Grande abraço...

Marlene Albertina Seward disse...

Sábado de carnaval e me vi sambando na passarela da literatura , com entusiasmo ao ler estes poetrix . Tão curtos e belos . Cheguei até aqui por conhecer algumas letras de outrora da autora, Conhecer agora um pouco mais sua trajetória e ler estas pérolas , por mim desconhecidas, fez do meu carnaval uma folia de poesia , oops é poetrix que se fala!
Parabéns Angela Bretas. Você é única !

Anônimo disse...

Ótima entrevista, querida! Sua trajetória vitoriosa descrita com a sua marca registrada. Parabéns! 👏👏👏
Lílian Maial

Marília Tavernard disse...

Excelente, muito bom conhecer mais um pouco de você e de sua trajetória de vida vitoriosa. Parabéns amiga, seus poetrix sempre muito bons.

Angela Bretas disse...

.
Agradeço a todos que tiraram um tempinho para ler esta entrevista. Gratificante saber-me lida ... 😘✍️