ANGELA BRETAS
Acadêmica ocupante da cadeira 4 da AIP
Entrevista concedida a Goulart Gomes
1. Fale um pouco sobre você, sua vida pessoal:
“Sou quem sou, simplesmente mulher não fujo e nem nego… Sou uma
mulher temperada, não deixo o sal da vida salgar o meu lado doce”. Além da
escrita sou apaixonada por artes visuais, especialmente a fotografia de
natureza, tenho um olhar fotográfico e poético, consigo enxergar a beleza em
tudo… Sou irmã, tia, amiga, engraçada, estilosa, curiosa, ativista
comunitária, voluntária, pecuarista, dona de casa, esposa, mãe de humanos, de
jardins, hortas, plantas, poesias e pets… Nasci e vivi minha infância em Santa
Catarina, parte da minha adolescência em Rondônia (família pioneira da região),
lá conheci meu esposo, pai dos meus dois filhos Casamos e fomos juntos para os
Estados Unidos, no ano de 1985.
2. Como se deu sua transição para os EUA?
Como foi essa aventura que deu certo? Uma longa história que já foi
descrita no meu livro Sonho Americano. Lá tive que me adaptar a uma vida
completamente diferente, aprender nova língua, me acostumar com o clima, lá
passei frio, sofri discriminação, xenofobia, assédio sexual, solidão… mas foi
lá também que me tornei mãe, estudei (sou formada em Broadcasting), trabalhei
em multinacionais, aprendi novos costumes, escrevi meus primeiros poetrix,
publiquei livros, coordenei antologias, fui colunista social, repórter
investigativa… Ufaaa! Nem acredito o tanto que já fiz, cansei só de lembrar.
Atualmente possuo dupla cidadania, brasileira/americana e divido minha vida
entre o aqui e o lá… Lá chamo de Flórida, onde residi por mais de duas décadas.
Aqui no Brasil, em Rondônia, onde vivo, resido na zona rural. Duas residências
paralelas e completamente distintas, que fazem parte da minha vida e me tornam
o que sou, onde encontro inspiração para escrever.
3. Como foi o seu início na literatura?
Desde sempre gostei de escrever e de jornalismo. Com o passar dos anos e
a mudança para outro país, a literatura e a leitura passaram a se tornar mais
presentes na minha vida. Estando fora do Brasil e tendo que aprender outra
língua me apeguei a leituras de livros em inglês. Assim que cheguei nos EUA fui
para Massachusetts, Boston. Lá necessitava usar o metrô para me locomover
e constatei admirada que a maioria dos presentes possuía um livro nas mãos, uma
era em que não havia celulares e os americanos viviam mergulhados em leituras.
O ar tinha cheiro de livros, de cultura, diariamente me via cercada por
estudantes da Harvard, MIT, entre outros, que usavam o mesmo trajeto diário. Naquela
cidade (Boston) há também uma das melhores e mais antigas bibliotecas do país
(Copley Square). Lá eu tinha acesso a milhares de livros, gostava de ir lá e me
perder entre livros e mais livros nos jardins seculares do local. Assim, foi
como, no início aprendi parte do meu inglês. Posteriormente, já na Flórida,
consegui uma bolsa de estudos e me formei. Comecei lendo livros de
história dos EUA, queria aprender tudo sobre aquele país. Depois passei a ler
os clássicos de Shakespeare, li vários do Stephen King e as poesias de Mark
Twain, Edgar Alan Poe, entre outros. Um dia fui comprar um casaco de frio em um
brechó, em Boston, possuía somente vinte dólares no bolso. Achei o casaco, que custava
quinze dólares, e ao me dirigir ao caixa avistei uma máquina de escrever,
destas antigas, pesadas, de ferro. Esta máquina custava os vinte dólares.
Desisti do casaco, optei pela máquina de datilografia. Recordo que carreguei
aquela máquina pelas ruas geladas de uma manhã de inverno. Usava uma camiseta
de mangas curtas. Entretanto, não senti frio. Abraçada à máquina sabia que ali
iniciava a escrita da minha história de vida. Seria minha terapia, deixaria um
diário de minha rotina. E assim nasceram as primeiras poesias, em Boston,
escritas nesta máquina. Várias delas foram publicadas em meu livro de
verso e prosa “Conversando com as Estrelas”. Posteriormente este diário foi
adaptado para um conto, com a inclusão de narrativas de outros imigrantes que,
assim como eu, estavam em busca do “sonho americano”, título do meu livro de
contos, também publicado e divulgado nos EUA. Frutos desta máquina adquirida em
um brechó. Após alguns anos em Boston, a comunidade brasileira foi
crescendo e foi fundado um jornal comunitário “Brazilian Times”. Fui colunista
deste jornal por duas décadas, escrevendo desde a história dos EUA, para que os
novos imigrantes pudessem conhecer também um pouco sobre o novo país. Dicas de
passeios, de serviços comunitários e, é claro, com um espaço para a poesia,
principalmente o poetrix. Nestas três décadas, em Massachusetts e Flórida,
publiquei três livros e fui curadora e idealizadora das antologias “Brava Gente
Brasileira em Terras Estrangeiras“ volumes 1 e 2. Antologias escritas
exclusivamente por imigrantes brasileiros residentes no exterior. Fundei uma biblioteca
comunitária. Promovi encontros lítero-culturais, concursos de poesia… enfim,
levantei a bandeira do hábito da escrita aos brasileiros no exterior. Com
orgulho recebi inúmeras condecorações internacionais, participei de encontros
literários e bienais nos Estados Unidos, Japão e Itália. Recentemente fui
empossada como “Imortal vitalícia / Doutora Honoris Causa” da ALB - Academia de
Letras do Brasil - SP, por ter contribuído com a divulgação e propagação da
literatura brasileira em terras estrangeiras.